São três horas da manhã. A lua, seminua, oculta-se sob o véu de nuvens. Os passos rápidos batem sobre as pedras como martelos. Os postes iluminam pouco. Oscilam, piscam, todos ao mesmo tempo. Ele já está acostumado. Às três e um da manhã ele cruza a rua. O chão é sujo, repleto de papel higiênico, restos de comida, roupas rasgadas de mulher. Ele nada olha. Os martelos continuam, desenhando um caminho firme sobre a lama, escolhendo cada pedra de forma certeira. O relógio marca três e dois da manhã.
Risos, muitos risos. Os dentes perfeitos destacam-se do rosto como pérolas em meio ao carvão. A pele brilha em sua perfeição, sua cor ébano resplandece. O peso do corpo a derruba. O álcool a derruba. Ao longe os sons do carnaval. Os joelhos estalam ao chocar-se contra as pedras. Ela continua a rir. Está bêbada.
Agora são três e dez e a porta está trancada. O homem se abaixa e tira algo da parte de trás do sapato, enfia na fechadura e torce. Deixa o metal ali, pendurado na porta. Pega um lenço do bolso e enxuga a testa. Ouve risos descendo a rua. Volta-se depressa para a porta e empurra com força o metal. A carne se rompe. São três e doze da manhã. A porta destranca. O homem entra.
A mulher vasculha a bolsa pequena, repleta de lantejoulas coloridas e luminosas. O poste pisca. A mulher xinga.
O homem a observa por uma fresta da porta. Sua saia está levantada de um lado. Dá pra ver a calcinha: pequena e verde, com uma pequena flor desenhada. Os joelhos são fortes, embora sujos. O cabelo está úmido por causa do sereno. São três e vinte da manhã. Ela procura algo em uma pequena bolsa, provavelmente a chave de casa. O poste pisca. A mulher xinga. O homem abre a porta.
O poste se apaga. Ouve-se um grito.
O metal cai sobre as pedras. Os martelos voltam a bater.
Ao longe as pessoas festejam o carnaval.
São três e vinte e dois da manhã.
Está escuro. A mão procura um caminho. A voz não sai, está presa à garganta. Engasgada. Há muita dor. As pernas não se movem. Não há mais carnaval. Não há mais porta. Não há mais nada. Apenas a mão, procurando no vazio algo que jamais descobriu...
São três e cinquenta e três da manhã.
Guardian
12/03/2009
Ruins remain through your system
Your blood is in my hands
I feed on your lack of wisdom"
Cardinal Sin - Resh
[☺]Soundtrack
Meu primeiro conto escrito especificamente com este objetivo. Meu test-drive. Por favor: comentem!
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